Comitê de brasileiros entrega carta de Lula a Martin Schulz
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O Comitê Lula Livre de Berlim entregou nesta quarta-feira (20/02), no Bundestag (Parlamento alemão), uma carta do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao deputado federal da Alemanha e ex-líder do Partido Social-Democrata (SPD) Martin Schulz.
A carta chegou à Alemanha pelas mãos do sociólogo Jessé de Souza, que está na cidade por motivos profissionais. Ao saber que o ex-presidente estava lendo seu livro A elite do atraso, Souza escreveu a Lula e mencionou sua ida a Berlim. Assessores do petista lhe pediram, então, que ele levasse a carta para Schulz, conta o sociólogo. O encontro foi organizado pelo Comitê Lula Livre de Berlim.
Na carta, Lula apresenta Souza a Schulz e fala sobre as eleições de 2018 e sua prisão em Curitiba. “As eleições produziram grandes alterações no quadro político brasileiro e que certamente vão atingir o cenário econômico e de modo a tornar pior a vida do nosso povo sofrido”, escreve.
Segundo o ex-presidente, teria havido um complô da direita, com apoio de empresários, da imprensa e da Justiça, para impedir sua candidatura e inviabilizar sua participação no processo eleitoral. “As decisões do Poder Judiciário, particularmente do juiz Sérgio Moro, influíram no resultado eleitoral”, alega.
Como exemplo, Lula menciona seu impedimento de dar entrevistas e a quebra de sigilo da delação premiada do ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci, que alegou que o petista e a ex-presidente Dilma Rousseff tinham conhecimento dos esquemas de corrupção na Petrobras. O retiro do sigilo foi autorizado por Moro, hoje ministro da Justiça, poucos dias antes do primeiro turno.
Lula lembra ainda os resultados alcançados pelo PT nas eleições de outubro e pede apoio do social-democrata. “A solidariedade internacional, na qual muitos companheiros de diversas nacionalidades estão empenhados, será de fundamental importância na nossa luta pelo Brasil e de resistência à brutal perseguição judicial de que estou sendo vítima”, completa.
Ao receber a carta, Schulz, que foi presidente do Parlamento Europeu entre 2012 e 2017, disse continuar acreditando que o processo judicial contra Lula é questionável e destacou que, apesar de não poder julgar o Judiciário brasileiro, tem forte desconfiança no caso do petista.
“Tenho sérias dúvidas em relação à legalidade do procedimento no processo contra Lula. Na minha compreensão do Direito, a presunção de inocência vale até a última instância e, por isso, Lula deveria estar solto”, destacou o deputado. Para ele, o processo tem motivação política.
Em entrevista à DW, Schulz pontuou ainda que o fato de Moro ter aceitado ser ministro da Justiça no governo do presidente Jair Bolsonaro levanta “sérias dúvidas” sobre a independência que o ex-juiz pregava durante a tramitação do processo de Lula.
“O procedimento do juiz Moro deixou transparecer para Bolsonaro que ele seria um bom ministro para o presidente e para seus interesses políticos. Não tenho provas de que Bolsonaro e Moro tinham contato antes, mas acredito que Bolsonaro não chegou à ideia de transformar Moro em ministro da Justiça porque tirou nos dados”, argumentou Schulz.
Questionado se não chegou o momento de o PT fazer uma reflexão sobre seus erros e promover uma mudança na liderança da legenda, como ocorre com frequência na maioria dos partidos da Alemanha, Schulz disse acreditar que o partido de Lula está seguindo esse caminho.
O deputado denunciou, contudo, que alguns grupos políticos no Brasil tentam passar a impressão de que a corrupção existe somente no PT. “Há no Brasil uma campanha difamatória massiva contra a esquerda”, ressaltou Schulz. Diante disso, afirmou o deputado, mesmo uma mudança completa no comando do partido não seria suficiente para reverter essa situação promovida por “extremistas de direita e pela imprensa”.
Schulz também fez críticas ao atual governo brasileiro. “Existe hoje no Brasil um ataque a instituições democráticas. Da própria Presidência parte uma campanha difamatória contra minorias e a oposição. Num sistema democrático, aqueles que estão no poder têm que garantir o direito da oposição. No Brasil, percebemos que o governo interpreta seu mandato como um exterminador da oposição. Isso é um sinal de alarme para a democracia”, afirmou.
O SPD, partido de Schulz, promoveu uma renovação da sua liderança no início do ano passado, desencadeada pelo péssimo resultado nas urnas e pelo fato de Schulz ter quebrado a promessa de levar os social-democratas à oposição. O deputado foi um dos arquitetos da atual coalizão de governo da Alemanha, mas sua influência na atual administração liderada pela chanceler federal Angela Merkel é hoje limitada.
Em fevereiro do ano passado, quando era ainda líder do SPD, Schulz perdeu parte do seu capital político ao cair publicamente em desgraça após ter manifestado a intenção de assumir o cargo de ministro do Exterior em um governo liderado pela conservadora Merkel, quebrando promessas eleitorais.
No final, os social-democratas acabaram se aliando mais uma vez a Merkel e formaram uma nova coalizão. Mas as ambições pessoais de Schulz foram intoleráveis para a base do partido. Ele renunciou à liderança do SPD no final de fevereiro de 2018.
Além de Jessé de Souza, a ativista Nina Glatzer, do Comitê Lula Livre, estava presente na entrega da carta. Esse não foi o primeiro contato entre Schulz e Lula após a prisão do petista. No final de agosto do ano passado, o deputado visitou o ex-presidente na prisão em Curitiba. Tanto sua visita quanto o recebimento da carta não têm nenhuma relação com a posição do governo da Alemanha.
Oficialmente, o governo de Merkel – que além do SPD e da União Democrata Cristã (CDU) ainda é formado pela União Social Cristã (CSU) – mantém silêncio sobre a condenação e a prisão de Lula. O mesmo já havia ocorrido em relação ao impeachment de Dilma Rousseff.
Prisão de Lula
Condenado em segunda instância, em janeiro de 2018, a 12 anos e um mês de prisão por corrupção passiva e lavagem de dinheiro no processo que envolve um triplex no Guarujá, Lula está preso desde 7 de abril de 2018 em Curitiba. O ex-presidente nega as acusações.
No início de fevereiro, ele foi novamente condenado, em primeira instância, por corrupção e lavagem de dinheiro, desta vez no processo referente a reformas realizadas num sítio em Atibaia, no interior de São Paulo. Ele ainda é réu em outras sete ações penais. Os advogados do petista alegam que o ex-presidente é vítima de perseguição política.